Quadro de Aventuras na Ilha do Tesouro, desenhada por Pedro Cobiaco

6 quadrinhos nacionais para ler antes de morrer

Faz tempos que há uma discussão sobre produção brasileira dentro da comunidade de quadrinhos. De fato, a cena de gibis brasileiros não é tão grande a ponto de virar um mercado. Mas isso está bem longe de ser por causa da qualidade dos nossos quadrinhos. Muito do discurso de que “quadrinhos brasileiros serão sempre ruins” vem da falta de conhecimento e acesso dessas produções. Pensando nisso, decidi fazer uma lista quadrinhos nacionais que, apesar de pouco conhecidos, são essenciais para se aventurar nas águas desconhecidas da cena independente de quadrinhos.

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Já Era (Felipe Parucci)

Autodefinida como uma “comédia psicodélica”, essa história em quadrinhos conta a jornada de Regina, uma jovem-adulta que larga tudo para comprar um barco. Porém, no meio disso, uma nave tripulada por um gato antropomorfo, o servidor geral P31DØ (uma tempestade voadora pensante?) e uma mulher de três olhos a abduz. A história gira em torno da exploração de Regina nesse novo planeta, onde ela adquire um status messiânico.

Em conclusão: não dá pra descrever esse gibi além de genial. A maneira leve, descontraída, sem lógica e e psicodélica que Parucci aborda questões complexas como racismo, colonialismo, imperialismo, crises de idade e poder transforma esse gibi essencial a todos que se interessam na cena independente. Aliás, é recomendado em especial para aqueles que veem esses desenhos adultos que combinam um traço simples, humor nonsense, filosofias e discussões complexas.

quadro de Já Era

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O quadrinho saiu pela editora Lote 42 em 2017, disponível na Banca Tatuí.

Aventuras na Ilha do Tesouro (Pedro Cobiaco)

No meio dos incontáveis acertos sob a produção da Editora Mino, com certeza Aventuras na Ilha do Tesouro, de 2015, é um dos quadrinhos que mais se destaca. Pedro Cobiaco, filho do também quadrinista Fabio Cobiaco, ganhou o Grampo de Ouro por essa história que discute arte, relação com pai, libertarismo e identidade.

O gibi é certamente difícil de descrever. O que começa com uma aventura em uma ilha mágica, se transforma em uma viagem densa, complexa, subjetiva, metafórica e artística dentro da cabeça do autor (que também é um personagem na história). Esse é um daqueles exemplos que, se fosse olhado com mais atenção, transformaria completamente a história das histórias em quadrinhos.

Como eu não conseguiria traçar uma sinopse, irei deixar aqui a descrição dada pela própria editora: “Aventuras na Ilha do Tesouro conta a história do Capitão. Jovem rebelde que mora em uma ilha mágica, cercado por garotos libertários e que se vê tentando entender sua existência a medida que a constrói.”

quadro de Aventuras na Ilha do Tesouro

Para quem procura quadrinhos que se desafiem na própria narrativa em pró da subjetividade, esse de fato é o mais indicado. Você pode encontrar ele na loja da Editora Mino.

Lavagem (Shiko)

E é aqui que eu expresso um extremo favoritismo pelos quadrinhos da Editora Mino. Lavagem é um dos quadrinhos mais conhecidos e vendidos da editora (e com razão). Ele conta a história de uma mulher muito religiosa que mora com o marido abusivo, dono de porcos, em um mangue. Não é o primeiro quadrinho de Shiko, mas é um bom ponto de início pra quem deseja acompanhar o autor.

quadro de Lavagem

O gibi se apresenta como um terror psicológico quando um pastor visita a casa do casal. Logo depois, essa figura pastoral, que é incerta se é um mensageiro de Deus ou do diabo, começa a tentar a mulher a matar o marido.

Enfim, a história é sobre emancipação e superação. Lavagem é certamente uma opção que merece ser escolhida, principalmente se sua vibe for terror psicológico com críticas sociais. Você pode encontrar o quadrinho também na loja da Editora Mino.

Yuri: Quarta-feira De Cinzas (Daniel Og)

A história gira em torno de Yuri, um jovem publicitário que odeia carnaval e é ressuscitado, após se suicidar, justamente no dia de carnaval. Aliás, segundo Allan Sieber, que escreve o prólogo, o gibi é uma homenagem por vias tortuosas à cidade do Rio de Janeiro. O traço é minimalista: apenas preto, branco e um tom de cinza à lápis. Mas mesmo assim, Daniel consegue transcrever uma visão da cidade e dos personagens que nos faz imergir na história muito rapidamente. Eu mesmo, assim que comecei a ler, esqueci o quão grande o quadrinho era e não consegui tirar meus olhos daquilo até terminar o último balão da última página.

É pelo humor nada enfeitado que se discute religião, racismo, homofobia e criminalidade. Como diz no prólogo, esse gibi é “um cartão postal que não foi feito para inglês ver”. Certamente, não conseguiria criar uma lista de quadrinhos nacionais sem citar Yuri.

quadro de yuri

Yuri: Quarta-feira de Cinzas saiu pela antiga Editora Conrad em 2011, você pode encontrá-lo na Amazon e em outras livrarias online.

Gnut (Paulo Crumbim)

Pois nem só de livro físico vive o homem! Gnut é uma webcomic publicada desde 2012 que consegue transformar as ferramentas da internet mais a favor da história do que qualquer outra que eu já tenha lido. Ela conta uma história psicodélica, com cores se alternando por gifs e ambientação ajustada por trilhas sonoras próprias.

Quadro de Gnut

Ademais, é realmente difícil descrever a história além de uma viagem imersiva, psicodélica, sensorial e alienígena acompanhando a trajetória de um universo completamente único criado pelo Crumbim. Você pode ler gratuitamente no site do quadrinho.

Veja também: O Poderoso Chefão Parte III: Diretor comenta sobre nova versão

Histórias Quentinhas Sobre Sair do Armário (Diversas Autoras)

Por fim, pensando na falta de conteúdo LGBTI+ dentro da cena, as autoras Annima de Mattos, Aline Lemos, Ellie Irineu e Renata Nolasco trazem uma coletânea de histórias sobre, de e para pessoas LGBTI+. Cada uma das histórias aborda perspectivas que trazem um sentimento gostoso e confortante, em especial para pessoas mais jovens ainda no armário. Ademais, o que mais se destaca é a história “E Daí”, de Aline Lemos, que fala sobre uma garota bi saindo do armário. A capa e a o nome fazem referência à capa histórica da Revista Veja em que Ana Carolina fala sobre sua (bi)sexualidade.

A coletânea foi financiada coletivamente e publicada de maneira independente em 2019, você pode encontrá-la na Loja Monstra. A continuação, “Histórias quentinhas sobre existir” também já foi financiada e está em processo de impressão.

arte de capa do quadrinho
Arte de capa de “Histórias Quentinhas Sobre Sair do Armário”

E aí? Faltou algum nessa lista de quadrinhos nacionais? Você conhece algum quadrinho nacional que acha que todos deveriam ler? Qual a sua lista de quadrinhos nacionais preferidos?

 

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