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RPG: Como estruturar NPCs – parte 1

Non-Player Character, personagem não jogável, são todos e quaisquer personagens em um RPG que não compreendem aos personagens dos jogadores, ou PCs (players characters). Os NPCs vão desde os animais da vila ao taberneiro, clientes e empregados. Desde marcantes aliados de grupo até os monstros e o vilão final da epopeia. A seguir apontarei como estruturar NPCs, conforme minha experiência como narrador.

 

NPCs e nós

Muitos narradores, jogadores, mesas em geral, estão acostumados com o elemento “NPC do mestre”, que sintetiza um personagem NPC em especial que catalisa a dinâmica de grupo, narrativa ou aventura em si. Particularmente, usei poucas vezes esse recurso e apenas em minha adolescência. Acabei me apegando ao uso de mais de um NPC dentro do núcleo de personagens principais. Isso acabou gerindo em minhas narrativas, particularmente falando, maior densidade para os mesmos. Tornando-os mais táteis e “tridimensionais” para os próprios players. Atualmente, isso é uma variável. O número de NPCs no núcleo de personagens variará conforme a proposta do que narro.

NPCs são um recurso narrativo muito valioso

Isso se deu tanto por repertório pelos anos de narrativa, quanto pelo observar de tal aspecto em outros raros mestres. Deixando claro que não é o “jeito certo”, não se aplica. Foi apenas meu modo de evoluir como contador de histórias. Dito isso, discorrerei abaixo sobre a dinâmica que uso para aumentar a vivacidade, importância e profundidade dos meus personagens, quando na posição de mestre.

Obs.: Emancipar e aprofundar seus NPCs não é o mesmo que categorizá-los mais protagonistas que seus PCs. Não faça uma coisa dessas, RPGista. Mesmo que a história gire em torno de um ou mais NPCs, ela tem como personagens principais na “mídia” os personagens dos jogadores. Estruturar NPCs não significa promovê-los, superestimá-los ou preferi-los.

 

Graus de NPCs

Uma técnica usada por mim é classificar os NPCs em três graus. No começo isso pode parecer um exercício, mas com o tempo fica totalmente natural e instintivo. Esses graus se referem ao contato e influência que tais NPCs tem para com os PCs e não para com a narrativa. Proximidade com os PCs!

NPC de 3° Grau: NPCs não recorrentes, se esporádicos, ainda sim bem poucos. Circunstanciais, passageiros. Pessoas, feras, entidades, seres cujo parecer não é essencial. Um comerciante de uma determinada cidade, um troll que ataca o acampamento, uma rainha maga vista em uma festa da realeza. Mesmo que sejam NPCs de peso no cenário, naquele mundo, se não possuírem grande impacto para com os players, estão neste terceiro e último grau.

NPC de 2° grau: NCPs com impacto mediano para com o núcleo de personagens principais. Podem ser figuras recorrentes dentre os mesmos, ou apenas manter contato e influência de forma indireta, tal qual um parente provedor de recursos, um necromante antagonista da campanha, um rival de ramo que ora ajuda por benefício mútuo, ora atrapalha. Podem ser pesos-pesados no cenário, na ambientação e história, mas quanto aos PCs, sua pungência é moderada e em intervalos médios para grandes de tempo. Não afetam o núcleo de forma corriqueira.

NPC de 1° grau: NPCs diretamente ligados, na prática, aos PCs. Passando boa parte, ou toda a aventura, campanha, crônica com os mesmos, constituindo também o núcleo de personagens principais no sentido de elencar indivíduos que correm no cerne da narrativa. Um aliado e irmão de batalhas passadas, uma montaria fiel, um inimigo que finge ser servil e prestativo até o final derradeiro, um amor descoberto no pontapé dos atos narrados.

 

Aprofundando NPCs em todos os graus

Faça-os vivos.

Independente do grau de um NPC, por mais passageiro e improvisado que ele possa ser, capriche! Faça-o palpável dentro daquele universo, se esforce e cative seus players. E isso também vale para estruturar NPCs que sejam crápulas. Não tem a ver com a índole ou ausência desta, a questão está em não servir algo raso. Salvo em casos em que a narrativa seja apenas declarada, acelerações e skips de tempo. Falo acima sobre momentos de roleplay, por mínimos que eles sejam.

“TABERNEIRO: “Hoje teremos o prato da semana com desconto de algumas coroas – moeda pátria – se eu fosse vocês ficaria. A nevasca logo virá. Estamos cheios, é verdade – olha para cima, como que para o andar superior após o teto de vigas – mas, sei que acharemos um cafofo para vocês”.

O taberneiro tem um sotaque carregado e fala vosso idioma de forma sofrida, muito arranhada. Ele parece muito servil. Preocupado com a capacidade do que seu estabelecimento pode oferecer em uma noite como essa”

 

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Parte do todo

Ao estruturar NPCs, retrate-os. Releve sempre sua raça (se houver esse conceito no cenário), etnia, época, idade, comunidade e função na mesma. Pense nele como uma criatura que vive ali, com ou sem a necessidade de ser um elemento narrativo para com os players, ainda que seja. Naquele mundo, ele jaz! Existe! Então interligue-o de forma natural ao meio que o cerca. Pense minimamente em um contexto. Esse mesmo poderá ser reciclado para outros do mesmo local, ou ligados a um evento, época, povo… Nada que precise ser escrito em uma nota ou rodapé -a não ser que você prefira – apenas um hábito que você adquire com o tempo. Se torna automático.

“Quando vocês chegam na parte baixa do bairro oriental do 41° distrito desta megacidade, notam que as pessoas que perambulam pelas avenidas caóticas, são asiáticas, mas estão mescladas dentre as muitas etnias do mundo pré-3° Guerra Mundial. Por entre os hologramas comerciais e imóveis embutidos uns nos outros, essa gente de cabelos lisos, olhos amendoados e puxados consomem seu capital. Variam bastante em tons de pele. Do antigo chinês ao antigo indonésio. Vocês podem esbarrar por aqui tanto em um carateca, quanto em um lutador de kung-fu”.

 

Descrição e detalhamento

Quando descrever NPCs, seja de forma generalista como um bando de animais pastando ou pessoas em uma feira de rua, seja de maneira mais específica como uma figura importante para se contatar ou influente de alguma forma, descreva suas características físicas. Não diga que é apenas um meio-orc. Diga se ele tem a pele malhada, mais clara ou mais escura. Se tem dentes externados, corte de cabelo moicano, tatuagem, adereços tribais… Estruturar NPCs também é caracterizá-los. Não precisa de uma descrição A La Tolkien ou Machado de Assis, todavia, pontue coisas que o faça ser reconhecido tanto pelo jogadores quanto por seus personagens. Conforme a percepção dos PCs que o notam, é claro.

“Vendo como aquela mulher se move, nota-se que é uma forasteira em Saintville. Suas botas tem um bordado indígena, suas esporas gastas não vendem no Bill’s e está quente demais para usar um sobretudo áspero. Cabelos loiros cacheados se derramam pelas costas. Quando ela olha por sobre o ombro, os olhos verdes denunciam urgência e estreitamento. Ou ela usa aquela roupa extensa para mascarar um ferimento ou para disfarçar uma espingarda carregada. Sua orelha direita, agora a vista, carece de um naco de carne perto do topo”.

 

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Uma vida até ali

Mais alinhado a NPCs de 2° e 1° grau, dada a importância dos mesmos para a história, crie um pequeno BG. Um contexto escrito das ambições, índole e experiências de vida significativas daquele NPC. Um paragrafozinho apenas, tudo certo! Esse pode ser o principal ponto do aprofundamento, você mesmo, como narrador, conhecer e entender seu NPC. Conseguindo isso, seus jogadores também serão contagiados por eles, para o bem ou para o mal, segundo o enredo.

“Lord Regrething é um homem arrependido. Apesar de suas posses, tanto as herdadas quanto as conquistadas, tem seu orgulho ferido frente os demais nobres. Ele tem maquinado por anos dado seu fracasso na última investida contra o inimigo logo ali na fronteira. A Coroa já não o considera de confiança. Ele está a ponto de quebrar sua conduta e credo para se reestabelecer, para os outros e para si mesmo. Ele então o fará! Forjará a morte da filha do duque, pagando para a sequestrarem. Com isso, eliminará seus contratados e levará a boa nova de que tudo não passava de um sequestro e que ele, em toda bravura, rechaçou os cães ímpios quando passando por suas terras. De quebra, “Lord Arrependido”, como é chamado, implantará um atentado a si mesmo e acusará o pai da sequestrada logo após devolvê-la, visando aumentar sua influência pela diminuição de um outro. Caso pensado. Está feito! Regrething será conhecido logo logo como o Lord das convicções”.

 

Retendo conteúdos

Certamente, com o tempo, você vai desenvolver algo muito importante. Algo chamado “repertório”. E isso não virá apenas das mesas se você assim não quiser. Livros, séries, filmes, peças, games… Tudo que ofereça formas de narrativa, criação de personagens, roteiro, interação. Quanto mais se cria um repertório mental, mais automatizado fica o manejo e aprofundar dos NPCs. Bem como o prazer em criá-los, em lhes dar vida e proporcionar interação para com seus jogadores através de seus PCs.

 

Continuaremos a estruturar NPCs na segunda parte deste artigo. Até lá, boas interação e rolagens, RPGistas!

 

Marcello Costa

Comunicador. Desde pequeno explorar o imaginário, o faz de conta e a narrativa de vida foi uma tendência. Não a toa, estudei Comunicação Social. Livros, HQs, músicas, animações, filmes e séries são de alto consumo, embora uma parte minha ainda penda de humanas para biológicas, agravando um forte apreço e interesse ambiental e em programas ligados á isso. Quem sabe por isso minha classe fantástica favorita seja o Ranger, ou Patrulheiro, ou Guardião, como preferir chamar. Sim, classe mesmo. RPGista inveterado, confesso. Uma paixão do final da infância que segue comigo até hoje.

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